21 novembro 2017

Justiça Social e Equidade em Educação – Portugal face à União Europeia

Através da Fundação Bertelsmann, acabamos de ter conhecimento do relatório sobre o Indicador anual de Justiça Social para a União Europeia (ler na íntegra aqui).

Como nos é referido pelo próprio relatório, numa importante e bastante desenvolvida secção sobre Metodologia, o conceito de justiça social é vago, difícil de delinear e, sobretudo, extremamente complexo, tal a sua permeabilidade por sistemas de valores cultural e historicamente determinados. Assim sendo, só podemos aproximá-lo através de indicadores parcelares de maior operacionalidade. No âmbito do consenso necessário à estabilidade e legitimação of a social market economy o conceito de justiça social equivale ao de promoção da igualdade de oportunidades ao longo da vida, devendo caracterizar-se mais pelo investimento em inclusão do que pela compensação ex-post da exclusão e da discriminação (op. cit. p. 80).

São seis os domínios fundamentais de observação e recolha de informação com base nos quais se constitui o indicador compósito de justiça social: prevenção da pobreza, equidade na educação, oportunidades de acesso ao mercado de trabalho, coesão social e não discriminação, acesso à saúde e justiça intergeracional. Os diversos sub indicadores, suas ponderações relativas e forma de combinação constituem objecto do já referido capítulo sobre Metodologia, a exigir uma leitura muito atenta.

A multidimensionalidade do conceito pode, assim, ser aproximada através de trabalho e análise de equipas interdisciplinares especialmente interessadas nas questões dos desequilíbrios e desigualdades sociais, obstáculos e desafios ao desenvolvimento (sustentado, integral, cidadão…), limitações da explicação económica convencional, entre outros aspectos da maior actualidade.

Consideremos o domínio da equidade em Educação. Relativamente a este aspecto, o índice composto revela-nos que em 2017 (dados provisórios) Portugal se situava em 26º lugar de entre os 28 EEMM da U.E., a seguir à Roménia e a Malta, com um valor para o índice de 4,92 face aos 6,28 correspondentes à média europeia, tendo aumentado apenas 0,99 relativamente a 2008.

Que significado têm estes valores?

Percebemo-lo melhor quando consideramos a partição daquele Índice composto nos diferentes sub indicadores que entram naquela composição. Antes de mais, o relativo ao estatuto socio-económico da família de referência: quanto mais elevado for este, maior a probabilidade de um bom desempenho estudantil dos filhos, sendo de notar que o nosso País ocupa o 9º lugar em importância relativamente à intensidade daquela influência. Esta conclusão viria certamente reforçada se os aspectos materiais do estatuto familiar tivessem sido combinados com os níveis educacionais dos pais e das mães dos estudantes, como nos revelam alguns estudos recentes.

O nível de despesa (investimento…) público no ensino pré-primário, em percentagem do PIB, constitui outro dos sub indicadores. É por demais conhecida a influência de uma boa educação de infância nos desempenhos escolares ao longo da vida e, especialmente, no nivelamento de oportunidades no acesso aos vários ciclos educativos, pelo que não se estranha a inclusão deste eixo de determinação. Ocupando o nosso País o 21º lugar, interessa sobretudo constatar que a situação actual (0,42) nos situa ainda muito aquém do valor relativo a 2008 (0,53) e que se denota nos últimos dois anos uma tendência para não prosseguir na recuperação.

Pelo contrário, a evolução do País no que respeita ao abandono precoce da escola tem sido extremamente positiva entre 2008 e o momento actual; não é de estranhar, já que naquele ano de partida ocupávamos uma das quatro piores posições no conjunto dos 28 EEMM. Prevê-se, no entanto, que a situação tenha voltado a agravar-se entre 2016 e 2017, com uma ligeira subida de 13,7% para 14,0%. Muito associado a este sub indicador está o relativo à percentagem da população com idade superior a 15 anos que não se encontra em educação/formação nem no mercado de trabalho: em 2016, com 17,5%, estávamos ainda longe dos 14,2% relativos a 2008 e a previsão para 2017 aponta para uma descida muito ténue, de apenas 0,3.

Também é de preocupar o valor, que se mantém muito elevado, da percentagem da população com escolaridade inferior ao 12º ano, nível da escolaridade obrigatória para a presente coorte geracional. Tendo apenas Malta em pior situação do que nós, os progressos neste domínio têm sido e continuam a revelar-se muito modestos.

Quais as limitações desta breve análise? Muitas e grandes. Com efeito, pouco se vai aqui além da “fotografia”, nada se avançando sobre a multiplicidade de factores responsáveis por esta insuficiência de resultados. Um estudo aprofundado exigiria, com efeito, que investigássemos sobre a influência da crise económica e das medidas de austeridade, os erros e descontinuidades de políticas públicas nos domínios da organização escolar, desenho e aplicação de programas e currículos, formação de professores, entre outros aspectos cruciais.

O certo é que os indicadores nos alertam, mesmo assim, para um aspecto que deixaríamos sublinhado: a tendência de evolução positiva parece agora estar a recrudescer, a entrar em estagnação, talvez até mesmo em regressão num dos casos, no que respeita a estes indicadores de igualdade de oportunidades em Educação.  

O que não pode deixar de constituir um alerta para os actuais poderes públicos.



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